terça-feira, 29 de abril de 2008

Livro de visitas

Os monos” (leia-se mônos) é o termo jocoso por que Perdido execra o monismo nas suas principais variantes, a saber: o monoteísmo, a monarquia, o monopólio e a monogamia. O monismo é o império do unitarismo pela defecção da variedade.

O monismo é uma espécie de pirâmide em que a contração do diverso no uno aumenta da base para o topo (processo de apropriação bottom-up) e se justifica no sentido inverso (processo de justificação top-down):

A monogamia é o processo unitarista mais elementar e significa “uma mulher para um homem”. Perdido não está propriamente a pensar na monogamia como algo que se possa opor à poligamia. Pelo contrário, a monogamia reforça a apropriação das mulheres que historicamente se começou através da poligamia. Com efeito, monogamia e poligamia opõem-se a monandria e poliandria que seriam, se tal existiu, um processo de apropriação inverso. Perdido pensa que a monogamia apenas permitiu um melhor controlo da mulher pelo homem do que a poligamia, não se afastando ambas da mesma essência. E que a monogamia conduz directamente à misoginia.

O monopólio tem uma natureza diversa pois visa a concentração de toda a riqueza nas mãos de um único detentor. Ao contrário da mulher a riqueza não tem singularidade, é um bem acumulável e fluido. A lógica do monopólio é a acumulação. Até hoje, traduziu-se em exploração da força do trabalho. No futuro, em que todo o trabalho será executado por máquinas, traduzir-se-á no extermínio (quase) completo da humanidade a favor da sobrevivência de uns poucos, os hiper-ricos.

A monarquia virá a ser todo o poder concentrado num estado único à escala mundial, provavelmente exercido sem acção humana e controlado pelo patriarca dos detentores do monopólio. Será a realização perfeita do “L’État c’est Moi”, do Quarto Reich. No passado e no presente, a monarquia camuflou-se sob as diferentes capas de oligarquia, tirania, monarquia hereditária, império e republicanismo. Todos estes regimes foram intervalados por períodos revolucionários em que o povo (a diversidade) se bateu pela apropriação do poder para a esfera do público (Res Publica). Todas as revoluções sossobraram no monarquismo com a apropriação privada da coisa pública. Não importa que os interesses privados se baseassem numa lógica de casta, de família, de interesse económico, de classe social, de corporação profissional ou outra qualquer. Fosse qual fosse o interessado, o regime era edificado para proteger o interesse que o sustentava. A democracia representativa é, no presente, a forma menos óbvia, mas a mais eficaz, de subtrair o poder ao povo de administrar a coisa pública e depositá-lo nas mãos de uma clique privada (partido, interesses, etc.). E é eficaz não propriamente pela eficiência do seu simulacro, as eleições. É eficaz porque revelou-se a forma mais rápida de subtrair o público para alargar o privado (“menos Estado”), confinando o público a meia dúzia de instrumentos de repressão: impostos e tribunais. As polícias, as milícias e os exércitos, esses vão desaparecendo também na vertigem das privatizações.

O que colocar no topo? Que cereja espetar no bolo? O que virá a ser a rolha desta garrafa de champanhe? O monoteísmo! O monoteísmo é o monopólio da divindade assacado por um deus. Fará isto sentido? É claro que faz todo o sentido: a melhor maneira de justificar o monismo no mundo existente, no mundo material, no mundo que conhecemos, é explicá-lo como um reflexo de um mundo monista de fantasia, de um mundo de natureza espiritual, de um mundo que não conhecemos, mas que nos é prodigiosamente revelado. A re-ligião, fundada na re-velação, explica o inexplicável e torna suportável todo o sofrimento humano. Quando o homem sofre (execuções em série, catástrofes naturais, epidemias, doença, fome à escala planetária, destruição ou esbanjamento dos recursos) é para expiar um pecado desconhecido e para merecer um mundo alternativo que lhe é oferecido. A mulhe subordina-se ao homem como a igreja a cristo. Todo o poder vem de deus.

Perdido é de opinião que a ideia de deus único é o pensamento mais execrável jamais produzido em toda a história da humanidade, quer se trate do homem das barbas ciumento que castiga o seu povo eleito num acesso de fúria descontrolado, quer na forma da abstração moderna do inteligente desígnio.

Os textos aqui reproduzidos são apresentados cronologicamente segundo o seu aparecimento em O Tremontelo. São textos de natureza diversa, sem fim condutor ou unidade aparente. São fruto da “pesquisa errática” que Perdido tão acerrimamente defende.